Uma pessoa muito especial

Ontem conheci uma pessoa muito especial, coisa difícil nestes dias em que pessoa para ser gente tem que ter nome e sobrenome, perfil no Orkut, Twitter e Facebook, ser pós-graduado em algum MBA famoso, possuir casa própria e um carro novo, além de assistir BBB, House e Lost.

Vida é gente simples. A começar pelo próprio nome. Quando lhe perguntei qual o sobrenome ela sorriu-me ternamente e perguntou se precisava ter mais algum nome além do primeiro. Disse-me que era feliz por manter as coisas simples, por ter apenas um nome e por poder se misturar na multidão e passar sem ser notada. “Mais uma Vida entre tantas”, disse-me ela com uma alegria que me convenceu a abrir mão de meus sobrenomes, e olha que são vários.

Vida não está nas redes sociais, não é capa de revista, nem mesmo das masculinas, apesar de sua estonteante beleza. Frequenta todas as festas da “High Society”, mas também está presente nas comemorações das lajes em todos os morros de comunidades. É cidadã do mundo e não precisa de passaporte para entrar em nenhum país. Não possui milhares de seguidores ou fãs anunciados, embora alguns insistam em se declarar fãs, seguidores idólatras e amigos fiéis da Vida.

Fiquei curioso em saber o que a tornava uma pessoa tão especial. Quem sabe não poderia trilhar pelos mesmos cursos de doutorado e pós-doutorados e tornar-me também uma pessoa especial, voltada ao outro, simples e sincero. Perguntei-lhe: “Qual a sua formação?”

Ela respondeu-me com ar de espanto, como se não compreendesse a necessidade de uma formação. “Sou formada na escola da Vida”. Retribui o olhar com outro de intensidade ainda maior!

Como poderia tornar-se uma pessoa tão especial, capaz de falar sobre tudo um pouco, de encantar a todos, dos mais simples aos mais doutos sem nunca ter frequentado a escola! Como poderia viver de forma saudável, arcar com os custos financeiros da liberdade se não tinha bons empregos?

Vida apressou-se em explicar antes mesmo que eu conseguisse elaborar a pergunta. É como se ela já estivesse acostumada a estas indagações. “É que sou amiga da Liberdade, da Simplicidade, da Beleza e de Deus”, respondeu-me ela como se somente aquela resposta fosse suficiente.

Quantos doutorados seriam necessários para compreender este fenômeno? Quantos documentários eu poderia produzir sobre uma personalidade mundialmente conhecida como Vida? Quantos artigos eu precisaria escrever sobre a Vida até conseguir compreender seu jeito simples de ser? Quantas lições poderiam ser oferecidas para aqueles que se sentem sozinhos e desamparados? Quantas transformações teria que realizar em meu jeito de ser?

Comecei a pensar que deveria procurar usar melhor o meu tempo, precioso recurso para ser feliz!

Quem sabe se eu começar a reduzir o tempo que invisto assistindo televisão e espionando os outros?

Quem sabe se eu investir um pouco mais nas relações, se eu brigar menos, sorrir mais, ajudar mais e atrapalhar menos o fluxo das coisas com minhas perguntas e teorias?

Quem sabe se ao despertar eu apreciar mais o sol nascente e as multicoloridas faixas luminosas que brotam no céu?

Quem sabe se eu observar mais o meu corpo e lhe der chances para respirar, para alongar-se e para descansar?

Quem sabe se eu tentar aprender com as nuvens que seguem ao sabor do vento transformando-se diariamente conforme as necessidades que se lhes impõe?

Quem sabe se eu reduzir as horas de trabalho diário para me dedicar à escrita, ao desenho, para a criação?

Já ia longe em minhas divagações quando Vida afagou-me a cabeça e disse.

– Viva. Respire. Transpire. Sinta as energias que lhe atravessam o ser a cada momento significando e traduzindo seus sentimentos e pensamentos em ações concretas. Conheça a Simplicidade.

– Lastime menos o passado. Preocupe-se menos com o futuro. Viva plenamente o presente e conhecerá a Liberdade.

– Observe seu entorno, observe a você mesmo, imagine seu interior e conhecerá a Beleza.

A esta altura já estava ansioso por perguntar como faria para tornar-me amigo de Deus. Não resisti e perguntei!

Vida olhou-me ternamente com um sorriso materno e disse.

– Quanto tiver conhecido a Simplicidade, a Liberdade e a Beleza elas te apresentarão a Deus.

Sorria e chorava naquele momento de iluminação, agradecido por ter sido apresentado à Vida em momento tão íntimo. Espero que nos tornemos amigos!